Com vocês, um pouco da cena cotidiana dos anos 80-90, registradas com doses de humor pelo nosso Geni( ex-língua de trapo da UFMA).
O jornalista que se diz “militante orgânico” promete revelar ainda, nas próximas crônicas, assuntos interessantes, como por exemplo, sobre a “patifa da baixada”, uma “reza que fez no terreiro duma bruxa do Paço”, “a bala do juiz que derrubou super Macho”, “o esquema da loló que irrigava os antigos carnavais num Clubão”, “caso de amor entre dois radialistas no bar-buzal”, e também sobre os motivos duma famosa “briga dentro dum veículo etílico em plena madrugada entre dois militantes”, e outras que valerão a pena ler. Confira abaixo:
Conto e poesias nostálgicas, será ficção ou realidade?
Certo dia encontrei uma pessoa na esquina do Banco do Brasil, no centro de São Luís. Já o conhecia há bastante tempo mas nunca tinha levado um papo reto com essa pessoa, achava-o meu esquisito, estranho, mas tinha curiosidade de saber o que ele fazia na vida. Sempre que o encontrava acenava para ele, e vinha na minha cabeça: quem é esse sujeito que sempre aparece nos lugares coincidentemente em momentos e situações oportunas?
Ele sempre usava roupas escuras, parecendo um corvo, pássaro encontrado na Europa, Austrália e em muito outros lugares. Por que ele se veste desse jeito? E por que encontro com ele sempre em situações oportunas? Será que essa pessoa é real, tem família, tem amigos ou é só uma miragem ou estou sonhando acordado? Até que um dia resolvi tirar essa história a limpo. E comecei a passar nos lugares em que sempre o encontrava, e nada de rever essa pessoa, será que no momento que decidi conversar, ele vai me virar as costas? aí tentei esquecer por um tempo essa obsessão de encontrá-lo, mas sempre com aquele pensamento de um dia revê-lo para perguntar e saber da sua vida, que muito aguçava a minha curiosidade.
Certo dia, vagando pelo centro de São Luís, indo de sebo a sebo, procurando livros raros, isso é uma especialidade minha, quem me conhece sabe que gosto dessas agendas, principalmente quando estou em estado de solidão e vulnerabilidade, sou uma pessoa simples, que gosta de pessoas simples e de ouvir histórias, andar pelo Centro Histórico, olhar os casarões, e imaginar as pessoas que viveram, que vivenciaram essa história, que ouviram o rufar dos tambores de São Luís, os poetas que aqui viveram e suas histórias boêmias, tudo isso passa na minha cabeça quando estou no Centro.
De certa forma, sou uma pessoa ingênua, que acredita em Papai Noel, em amores impossíveis, em histórias mirabolantes, que só passam nas cabeças das crianças, tanto é que não construí nada em minha vida. Mas não me arrependo de nada, até porque viver em um bairro pobre de São Luís, com estigma de violência, sem ostentação, um bairro que hoje é conhecido como o maior quilombo urbano do Maranhão e do Brasil é um privilégio, de não ter sido nunca assaltado e de nunca ter sido alvo de qualquer violência.
Liberdade como o nome diz, é uma dádiva, é uma benção, tenho orgulho ter nascido e me criado lá, meus amigos todos, a maioria, passou no vestibular da UFMA, e todos eles viveram com dignidade, tanto os que ficaram quanto os que morreram. Imagina uma pessoa pobre, nascido em um bairro pobre de São Luís, conseguir chegar à universidade e ter amigos influentes, é uma raridade, acho que toda pessoa tem um destino a trilhar e o meu não seria diferente, até parece que estou contando a minha própria história e não a da pessoa de que eu quero falar. A minha história não é bem parecida com a dessa pessoa, pode imaginar, por que estou falando de mim e não dela? Nem eu sei, quando a gente escreve passa tanta coisa na cabeça que a gente nem percebe… A Liberdade traz em si um sentimento de saudades, daquela vida pacata de outrora, da quebra de preconceitos e de intolerância, principalmente da dignidade da pessoa humana. Liberdade em que nasci e me criei é um celeiro de artistas e poetas. Quem anda pelas ruas do bairro nota de imediato, a cada esquina, a cada canto, a cada rua é um nome de um poeta, eu nasci, por ironia do destino, na rua Machado de Assis e transitei muito na paralela, Gregório de Matos, o boca do inferno, nome dado para ao poeta pela sua sátira aos problemas sociais da sua época, no Brasil Colônia.
Mas a curiosidade do leitor não é saber da minha vida, é claro, mas da história dessa pessoa que vou descrever agora. Essa pessoa apareceu do nada e me surpreendeu, de forma que fiquei inerte ao vê-lo. Será que é ele mesmo, ele não costumava andar desse jeito com essa indumentária ou ele estava passando por algum problema? mas logo percebi que estava enganado, não via tristeza em seu semblante, não estava mais de preto, estava no êxtase, com roupas coloridas e muito alegre, e parou pra conversar comigo, algo que ele não tinha feito no decorrer dos anos. No momento que o parei, numa ansiedade toda, fui logo direto no assunto:
-Por que você deixou de andar de preto?
Meu nobre Genivaldo Abreu, sempre tive vontade de conversar com você, acompanhei toda a sua trajetória, seu estilo de vida, seus amores, sua militância politica, sempre em defesa dos mais pobres, sua luta pela democracia e tantas outras coisas. Sempre passou na minha cabeça que você não era real, não cuidava de você mesmo, sempre preocupado com os outros. Ficava impressionado com você, via de longe seu entusiasmo pela vida de outras pessoas, Achava que você era santo, que não era real, gostava de se importar com as pessoa , principalmente com as pessoa que mais precisam e esquecia de se importar com você?
Isso me intrigava, Por que ele quer falar de mim e não dele? e minha ansiedade ia aumentando e o tempo passando e nada de ele querer falar da sua vida. Mas em fim ele resolveu dar o ar de sua graça.
-Meu nobre Genivaldo Abreu, toda vez que você me encontrava de preto, era porque eu estava de luto pela situação política em que se encontrava o nosso País, na época em que Brizola era vivo. E tudo o que ele falou e disse está acontecendo agora, Brizola parecia mais um profeta. Depois eu desapareci por um bom tempo pelo falecimento de Dr Jackson, e depois você sempre me encontrou de preto: estava de luto pelas mortes na pandemia, perdi vários amigos nessa peleja…
-Por que você está alegre desse jeito e vestido com essa roupa colorida e de sorriso alegre?
-Por vários motivos : um deles é ter te encontrado vivo e na mesma luta de sempre e a outra é saber que mais de 70% das pessoa estão vacinadas e as mortes diminuíram substancialmente. Essa é minha alegria, meu nobre amigo Genivaldo Abreu, se cuida! O amor tem dessas coisas
Amar é ter inclinações musicais e poéticas, é ter sentimentos puros, é acreditar nas pessoas, é ter afeição e doçura, é andar de peito aberto, é usufruir das quatro estações sem devastar, é se preocupar com os outros, sem egoísmo, com ternura, é sorrir sem ver os dentes, sem julgar, sem condenar, é dar ampla defesa, é ouvir , é testemunhar, é ser capaz de entender sem menosprezar. A vida é um imaginário, é uma compilação de sentimentos bons e ruins, O amor é leal, nem um outro é igual, esse é o momento de ser feliz e não desdenhar do sentimento alheio. Pensar sem perder a ternura Que bom pensar, refletir sobre a vida, lembrar das coisas boas e ruins, sonhar, viver sem perdoar, o perdão é submissão, é covardia, é anular a nossa verdade sem vaidade, é ir ao fundo sem se afogar, é voltar em si e perceber a realidade sem temer, sem dar explicação do seu sentimento, é uma uma coisa só tua, ninguém sabe o que passa na cabeça de uma pessoa. O sentimento é algo introspectivo, é alienante, é um transtorno, possessivo e obsessivo. O amor é também patológico, só cura quando passa, é obvio. Amor Platônico O amor é belo, é triste, mas não revelo; o amor é sentimento puro, é loucura, também é doçura, é uma passagem efêmera, que deixa lastro, é um terremoto vulcânico que explode o coração, é uma fraqueza não tão romântica assim, é poesia, é um sentimento que consome, que dói no fundo da alma, dilacerada.
Não vamos entender o amor, ele não foi feito para o entendimento, é uma abstração do coração, é avassalador que transcende a dor, no fundo deve ser alguma dívida com algum ser oculto, interplanetário, um dilúvio, uma tormenta que parece que não acaba nunca. Um Platonismo desarcebado, impossível, que vai além do nosso ser desejante, o amor é impossível, é possessivo, é uma criação da nossa cabeça, que só pesa no coração . Nascimento Eu não nasci pra sofrer, não nasci pra cantar, não nasci pra calar, nasci pra amar, nasci pra ouvir e observar, correr quando querem me atingir, viver na paz sem olhar pra trás, andar de pé descalço, sentir a terra que há de me devorar na minha fraqueza, sem desilusão, sem aflição, com o coração cheio de amor pra externar.
A vida é um tormento, é decepção, é coisa do coração, paixão é ilusão, é sofrimento, é abstração, lembranças…passa tanta coisa na cabeça da gente, que a gente nem sente. É como viver em outro mundo, no paraíso, onde não tem maldade, é uma infinitude de coisas belas. Viver uma ilusão de que ser forte bastaria numa sociedade preconceituosa, desigual, mas o amor é mais forte de que tudo isso, ansiedade nos causa dor, fadiga, nos maltrata, nos leva ao sentimento de ódio que nos consome, vamos resistir a tudo isso: a vida nunca foi fácil pra ninguém, só lamentação, só pandemia e desilusão, sem crise e sem confusão vamos seguir em frente, com alegria, humildade, amor e perspicácia. Descaminho Andei, andei, não te encontrei. Fiquei a tua espera no escuro. O nosso amor é tão puro. Não suporto mais esse caminho cheio de obstáculos. Sem luz, sem amor, distante de nós. Na travessia podemos encontrar um algoz, que não seja nós, nem à solidão. Porque isso mataria de desilusão uma suposta união. Mas o nosso amor é tão puro, que nem o tempo percebe, talvez o sol clareia o rosto e a lua ilumina o corpo de homem que não enxerga tão longe. Não suporto mais esse caminho, que não sei onde vai dar, talvez um dia imagino andando por lá.