Em artigo, Zé Reinaldo fala de sua luta pela Transposição do Rio São Francisco…

Em favor do Brasil

Olhando para trás, vejo, com orgulho, que minha passagem na direção de importantes órgãos da administração federal, levou ao estudo e a realização de importantes projetos para o desenvolvimento nacional.

Esses projetos, entretanto, foram duramente criticados na época pelos donos do poder real, os grandes empresários e banqueiros e outros poderosos que no mundo todo formam o que se convencionou chamar de establishment- ordem ideológica, econômica, política e legal que constitui uma sociedade ou um estado- como define o GOOGLE.

No fundo, sabemos, são os que detém o poder de fato em um país. Eles não queriam saber, na ocasião, de grandes investimentos estruturantes fora do sul e do sudeste, região dos seus maiores interesses.

Eu porém, estou acostumado a nadar contra a maré, nordestino que sou, confiante e devoto de São José de Ribamar, e não entrego os pontos com facilidade e me orgulho de ter enfrentado os poderosos que manipulavam a imprensa contra mim e contra os projetos.

Mas, que projetos são esses? Um é a Transposição de Águas do Rio São Francisco e outro é a Ferrovia Norte Sul. Entre outros de menor expressão.

Estou escrevendo no domingo o meu artigo de todas as terças do JORNAL PEQUENO e acabei de ler no jornal O GLOBO, um artigo do importante jornalista Elio Gaspari, chamado “A Boa Notícia Vem do São Francisco”. Ele fala que Lula encantou-se com a ideia de transposição das águas do rio São Francisco e transformou-a numa das joias de sua coroa. E resolveu toca-la, mesmo sem completar os projetos executivos apenas com projetos básicos.

Isso levou a atrasos e aumentos de preços mas, diz ele, “apesar de tudo isso, uma parte do projeto está ficando pronta. As coisas boas também acontecem”.

Ele fala que as águas do trecho já pronto já chegam a Paraíba levando água a dezenas de cidades, inclusive a Campina Grande.  E continua: “ ao contrário do que diziam adversários do projeto, a transposição de águas do Rio São Francisco não foi a Transamazônica do Lula. A ideia foi vista com certo preconceito regional e uma greve de fome de um bispo transformou em problema algo que era solução. No capítulo dos grandes projetos petistas, o do trem bala, que ligaria Rio e São Paulo apanhou muito menos que o da transposição. Com uma diferença a velha ideia das águas do São Francisco era boa e deu certo”.

O Elio Gaspari é o primeiro grande jornalista, independente, que dá a importância devida a esse projeto.  Só que ele não começou com Lula, que teve, sim, a sensibilidade política de sentir a grandeza do projeto, que na verdade passou pelas mãos de vários presidentes sem merecer a atenção devida em face de seus enormes benefícios sociais.

Mas, como tudo começou? Vamos voltar para o ano de 1980, Mario Andreazza iniciava a sua gestão no Ministério do Interior no governo de João Figueiredo e me nomeou Diretor Geral do DNOS- Departamento Nacional de Obras de Saneamento, com sede no Rio de Janeiro, e logo me chamou a Brasília para despacho. E lá depois de discutirmos a programação de obras do DNOS ele me falou: Nós precisamos encontrar uma solução definitiva para esse problema gravíssimo das secas periódicas do nordeste. Ouvi falar que há 150 anos, no Brasil Imperial o Dr. Marcos Antônio de Macedo, da elite cearense propôs a feitura de um canal por onde passariam as águas do São Francisco para o semiárido nordestino, atendendo o Ceará, Paraíba e Rio Grande do Norte. Estuda isso.

Eu, como engenheiro achei possível, e voltando ao Rio reuni a equipe do DNOS, órgão de excelência nessa área, com grandes hidrólogos de muita experiência e ótimos engenheiros experimentados com a construção de canais e casas de bombas já que o órgão tinha como uma das suas funções o controle de enchentes. (As barragens do Pericumã e Flores são dessa época minha no DNOS).

Pedi para fazerem um estudo básico, preliminar, e o resultado mostrou a viabilidade do projeto. Com esse estudo procurei o Banco Mundial, que afeito a esse tipo de obras no mundo inteiro rapidamente aprovou o projeto e deu recursos para desenvolve-lo. Pedimos a ajuda da Secretaria de Estado do Interior do governo americano e vários técnicos foram cedidos para nos ajudar. Os EUA já fizeram dezenas de projetos de transposição de bacias, alguns maiores do que este e transformaram a Califórnia de um deserto em um dos estados mais ricos do mundo, com grande produção agrícola.

Rodei os EUA de ponta a ponta, de carro, em missão oficial acompanhado por técnicos americanos, conhecendo tudo.

Quando viram que o projeto ia ser feito começou a guerra contra ele. Como Andreazza abriu a rodovia Transamazônica começaram a chamar o projeto de Transamazônica Hídrica do Andreazza e saiu artigo nos principais jornais brasileiros ridicularizando o projeto. Uma bobagem, diziam. O jornal Estado de São Paulo na época quase um porta voz do establishment bradava contra. Me entrevistavam só para contestar tudo. No próprio Ceará técnicos do DNOCS se declararam contra, assim como grande parte da esquerda católica.

Apresentei o projeto ao Presidente Figueiredo, que elogiou, mas não se comprometeu.

Já no governo Collor, Eliezer Batista, ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos quis conhecer e ficou fascinado pelo projeto. Mas foi Lula, certamente alertado por Ciro Gomes, que como governador do Ceará me acompanhou em algumas viagens aos EUA, e conhecia um pouco do projeto, é que realmente viu o que representava esse projeto e que teve, finalmente a coragem de fazer. E tomou, finalmente, a decisão. O projeto foi o nosso do DNOS, em todos os detalhes. Seguiram o projeto totalmente.

Não dá, aqui em um artigo de jornal, de contar toda a odisseia que foi a luta por esse projeto. Precisaria de um livro que na verdade escrevi e publiquei.

Lula, agora, recebe os elogios, sem dúvidas, merecido. Mas, quando o fez já não havia a luta terrível, contra, de antes.

Parabéns às mulheres, lutadoras, inteligentes, companheiras, mães, sem elas não haveria nenhuma civilização na face da terra. Minhas homenagens, respeito e admiração.

Por José Reinaldo Tavares, deputado federal e ex-governador.